26 de dez. de 2009

HISTÓRIA: Cap. 5 - Começa a bandalheira...


Muito embora o art. 12 do Decreto nº 21.576 tivesse estabelecido em 40% o limite legal de comprometimento das verbas salariais, a desobediência a esse teto era uma constante. Isso pode ser em parte explicado pela feroz concorrência provocada pela profusão de consignatários, aliada às particularidades do sistema adotado para o custeio das gratificações pagas aos servidores lotados nas Seções de Consignações de cada repartição, à fiscalização insuficiente e à brandura das medidas punitivas. Como a lei previa que 70% da receita decorrente da arrecadação da tarifa de averbação (0,5% sobre o valor das consignações) deveria ser mensalmente rateada pelo respectivo diretor ou chefe de seção com os respectivos funcionários, estes eram frequentemente “estimulados” pelos corretores das associações a averbarem valores além dos limites legais.


A propósito disso, Ruy Barbosa já afirmara na Exposição de Motivos do Decreto nº 172, de 21 de janeiro de 1890:


É principio que ainda nos vem da legislação fiscal dos tempos coloniaes – que o empregado, para cumprir o seu dever, deve ter uma porcentagem da arrecadação, que o estimule a ser mais zeloso com a mira no interesse de maiores vantagens. Como principio, não é acceitavel, porque estabelece um estimulo pouco nobre, animando a ganancia e levando muitas vezes o funccionario a excesso de zelo no intuito de maior lucro. Na pratica tem dado logar a abusos, sem alcançar o fim do legislador”. Sábio e visionário Ruy Barbosa. Realmente, uma águia!


Em muitos casos, os próprios encarregados da averbação tornaram-se corretores das associações (uai, como isso é atual!). Como resultado, elevado índice de endividamento do funcionalismo e suas consequências diretas: desestímulo e absenteísmo. Urgia, assim, uma reforma sistêmica, que tivesse o condão não só ajustar a dívida do funcionalismo a níveis mais adequados, mas, principalmente, de eliminar a possibilidade de novas investidas das associações e caixas beneficentes. Com efeito, estimuladas que foram pelo governo federal desde 1917, em duas décadas de atividade essas entidades se transformaram em meros balcões de agiotagem, muitas criadas com esse único desiderato. Em estudo levado a efeito sobre o assunto, na época, o extinto Conselho Federal do Serviço Público Civil concluiu, a propósito da aplicabilidade do Decreto nº 21.576:


Verifica-se, pelo exposto, que todos concordam em que o regime das consignações em folha de pagamento, com a largueza permitida no Decreto nº 21.576, de 27 de junho de 1932, não deverá continuar, porque já é forçoso considerar esse regime uma frustrada iniciativa oficial em favor dos servidores e pensionistas do Estado”. “... Examinando ser, porém, com sereno espírito público, o caso alarmante que ora solicita remédio, chegar-se-á à conclusão de que situação clamorosa se tornou por duas imprevidências: a do Estado, que confiou no tino econômico dos seus servidores e pensionistas, na honestidade dos que estariam sob sua proteção legal, emprestando dinheiro a juros, e na eficiência da fiscalização oficial contra os faltosos, e a dos próprios servidores e pensionistas que, diante da facilidade de jogar com o crédito, passaram a sacar sobre o futuro, despreocupados dos dias vindoiros”.


E foi com apoio nesses estudos do Conselho Federal do Serviço Público Civil e em opiniões emanadas do Ministério da Fazenda que foi editado o Decreto-lei nº 312, em 3 de março de 1938, alicerçado nos princípios de que “... é dever precípuo do Estado proteger a todos os cidadãos, principalmente os que se encontram a seu serviço; ... a prática tem demonstrado ser inconveniente para os servidores, inativos e pensionistas civis da União, o regime das consignações em folha de pagamento, regulado pelo decreto número 21.576, de 27 de junho de 1932; ... há institutos oficiais que podem oferecer aos servidores, aos inativos e pensionistas da União, recursos em condições mais favoráveis; ... entre os inconvenientes do regime em vigor está o de permitir-se que o servidor público sofra, permanentemente, uma redução de proventos superior ao que deveria constituir sua reserva econômica".


Sobre o Decreto-lei nº 312 discorreremos na próxima postagem sobre a história do consignado no Brasil.


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